
Vou falar um pouco sobre a apuração de haveres na dissolução parcial da sociedade empresária. Estabelecida a dissolução parcial, se segue a apuração de haveres, com a mobilização financeira do que é de direito do sócio, em relação ao valor atual da sociedade. Ou seja, será definido o valor patrimonial da participação societária, de forma que não estamos falando aqui de valor nominal ou de mercado. Essa apuração de haveres pode ocorrer judicial ou extrajudicialmente.
Em geral, a resolução mais eficiente para os sócios será alguma forma de mediação ou arbitragem quanto ao valor da participação, posto que este será necessariamente quantificado.
Neste contexto, é muito importante o diálogo ativo, em busca de caminhos para um consenso [13]. Uma mediação ou arbitragem pode ser essencial para que as partes não se vejam envolvidas em um conflito duradouro que pode trazer altos prejuízos para todos. O litígio deve ser a última opção, mas muitas vezes basta que seja a opção de uma das partes para que todos tenham que seguir por este caminho. E aí um problema que envolve um determinado valor em risco hoje se torna um problema de 3 a 10 vezes maior em algum tempo. Para este problema serão trazidos juízes, desembargadores, analistas, peritos judiciais, oficiais de justiça, advogados das partes e todo um aparato administrativo que será custeado por todos. Além disso, os valores serão atualizados com juros que correrão durante o debate judicial.
O fato é que a definição do valor de uma empresa não é uma ciência exata, mas existem formas relativamente seguras de avaliação e precificação. Empresas e profissionais especializados desenvolvem uma análise bem profunda e com segurança, utilizando estruturas já difundidas na prática de mercado. Essa análise de valor é comumente chamada de avaliação ou valuation.
O pagamento dos haveres do sócioprecisa estar adequado à proteção do patrimônio da sociedade, sendo importante frisar a vedação ao enriquecimento sem causa. Ou seja, as partes precisam receber sua participação sobre o valor exato da empresa, havendo, portanto, um crédito a satisfazer. Neste contexto, é privilegiada a manutenção da atividade empresarial, bem como o resguardo dos direitos de eventuais credores.
O RITO PROCESSUAL DA APURAÇÃO DE HAVERES
A dissolução parcial da sociedade realizada em juízo tem o rito processual da apuração de haveres. O magistrado, na condução da apuração [14]:
O juiz observará o que for eventualmente previsto no contrato social sobre o pagamento destes haveres. Sendo necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades (conforme artigo 606, §único, do Código de Processo Civil).
APURAÇÃO DE HAVERES VIA ACORDO
O melhor dos mundos é a apuração de haveres via acordoentre sócios e/ou outras partes envolvidas. Digo isso, pois é muito comum que não haja acordo sobre o valor da empresa. Tem sócio que nem quer discutir sobre pagar nada para aquele que está se desligando, por exemplo. Aqueles amigos de velha data, que sempre trabalharam juntos, muitas vezes viram opositores ferozes, quando a carteira vai para o meio da relação.
No entanto, mesmo os sócios mais antagônicos podem entender a eficiência de contratar uma perícia externa para avaliar a empresa e lidar com o conflito, de maneira programática. Seguir pelo caminho judicial para avaliar a empresa é fazer a mesma coisa, mas trazendo para o debate todo um aparato público. Isso elevará os custos do problema e o tempo de resolução de uma simples dissolução societária, o que em geral faz brotar diversos outros problemas para todos!
O advogado empresarial especializado em direito societário lida com muitas dissoluções em sua carreira e vai sempre buscar conduzir todas as partes pelo caminho mais eficiente. Fornecer clareza e confiança no procedimento pode ser um desafio, pois é muito comum que um dos sócios simplesmente se negue a conversar.
COMO REALIZAR A APURAÇÃO DE HAVERES?
Mas afinal, como realizar a apuração de haveres? Como identificar o valor certo da participação na empresa? [15] [16]
O valor da participação será o valor econômico, contemplando ativos e passivos, tangíveis e intangíveis, bem como a capacidade da empresa gerar renda para seus sócios. Há, neste sentido, uma análise das perspectivas da atividade empresarial dentro desta precificação, que tem uma base no chamado “fundo de comércio” formado. E isso é natural, pois envolve o retorno econômico do investimento do sócio no desenvolvimento daquela sociedade que, afinal, gerou um valor.
É comum, para a análise do valor da empresa (muito rotineira em projetos de investimento), usar por base o indicador EBITDA. EBITDA é a sigla em inglês para Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization. Em tradução livre, significa lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização. O valor é identificado e se avalia a empresa utilizando um múltiplo desse indicador.
Outra abordagem é o fluxo de caixa descontado. Em linhas gerais, será desenvolvida uma projeção de fluxo de caixa livre da empresa, com uma taxa de desconto da oportunidade.
Estes são alguns dos critérios, mas cada empresa tem uma complexidade e história que são próprias, demandando uma análise especialmente desenvolvida para ela. Pensemos numa startup que passou anos em desenvolvimento e acabou de registrar uma patente testada que pode ser negociada em todo o mundo, com alto impacto de mercado. Ela não gera recursos ainda, de forma que a análise do valor de mercado desta empresa pode ser muito desafiante pois há uma potencialidade possivelmente difícil de precificar.
Agora, o valor de mercado de uma empresa pode estar muito nos olhos de um adquirente. Por exemplo, uma empresa do setor de transportes que opera em São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais vai comprar uma empresa de transportes que só opera no Rio de Janeiro. A aquisição de uma empresa menor por uma maior é uma ótima estratégia de ampliar o mercado de um negócio. Por isso, a pequena empresa do Rio de Janeiro pode ser valiosa para a grande. Pode ser mais valiosa para a grande empresa do que seria, digamos, para alguém que não é da área e quer ingressar agora, através da compra da empresa.
Então, o que eu quero dizer é que a avaliação de uma empresa tem essas flutuações e a apuração de haveres vai buscar um valor de mercado aproximado. O foco, aqui, é tornar a situação justa para todos os envolvidos, pacificando os interesses em meio à dissolução parcial.
SAÍDA DE UM SÓCIO COM A ENTRADA DE OUTRO
Certas sociedades empresariais voltadas para a prestação de serviços, como pequenos hospitais ou clínicas, costumam negociar a saída de um sócio com a entrada de outro. Dessa forma, a saída de um sócio é financiada pelo ingresso de um novo sócio na empresa, que adquire essa participação. Isso tende a simplificar o caso (simplicidade tende a tornar a solução mais facilmente aceitável e o escritório de advocacia empresarial especializado em direito societário persegue essas opções).
Em todas essas situações, é muito importante o envolvimento de um escritório de advocacia empresarial. Ele terá uma equipe já formada para o desenvolvimento de um trabalho de excelência, através de um procedimento claro que possa ser acompanhado e compreendido pelos sócios, herdeiros, credores e/ou terceiros envolvidos.
13 Nada mais importante quando os sócios estão discutindo aspectos relativos a causas e apuração de haveres na dissolução parcial da sociedade empresária.
14 Na forma do artigo 604 do Código de Processo Civil.
15 O artigo 606 do Código de Processo Civil informa: “Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma.” A expressão preço de saída, utilizada no artigo, se refere a preço de mercado, que é quanto alcançaria, hipoteticamente, caso a participação fosse negociada no mercado.
16 Enquanto o Código de Processo Civil fala em balanço de determinação, o artigo 1.031 do Código Civil fala na realização de balanço especial. Este é um ponto importante, pois os balanços contábeis ordinários não são ideais para a avaliação da empresa, posto que não computam bens intangíveis. Eles obviamente podem ser instrumentos para a análise, mas não definem em si o valor da empresa no mercado.
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