23 mar O Advogado Empresarial e as estratégias de negociação integrativa
O advogado empresarial vive, ao longo de sua carreira, muitas negociações sobre as mais variadas questões. Ele pode estar negociando o contrato de venda de uma empresa ou um complexo built to suit com um operador do mercado financeiro, um locatário, uma empresa construtora e o proprietário de um imóvel. Independentemente da situação, é extremamente útil ter noções sobre estratégias de negociação integrativa.
Vamos falar de quatro abordagens para promover a criação de valor no curso de negociações.
Já falamos aqui neste canal sobre o quanto a habilidade de negociar é importante para a prática jurídica. Por isso, vamos buscar falar um pouco sobre o assunto neste e em outros materiais futuros. Existem algumas ferramentas diferentes que podem ser usadas em uma negociação. Vamos abordar uma publicada pelo Programa em Negociação da Faculdade de Direito de Harvard (1), que pressupõe uma análise mais ampla do contexto da negociação.
Meu nome é Maurício Perez e hoje vamos falar sobre o advogado empresarial e o uso de estratégias de negociação integrativa.
PREPARE PARA CRIAR VALOR PARA TODOS
Quando você preparar um processo de negociação, é recomendado ter um foco especial nestes aspectos:
- Para você, qual é a melhor alternativa para o acordo que está em negociação? Ou seja, caso esse acordo não seja fechado, quais são as opções existentes? Qual é o custo de adotar esta outra opção? Com isso, temos o custo de não realizar a operação, sem falar no tempo dos profissionais envolvidos.
- Quais são os interesses mais importantes? Quando for realizar uma negociação, faça uma lista colocando em ordem de importância quais são os interesses. Assim, poderá estabelecer prioridades e ter uma melhor métrica de realização.
- No ponto de vista das demais partes, qual é a melhor alternativa para a negociação? Ou seja, caso esse acordo não seja fechado, qual é a alternativa para os demais? Para compor uma boa negociação, precisamos entender as circunstâncias dos demais com detalhes, se possível.
Mapear estes três aspectos com cuidado leva a uma maior chance de desenvolver uma proposta que aborda com eficiência critérios concretos de adequação às circunstâncias da operação.
É importante que o advogado empresarial tenha um mandato amplo, que lhe permita explorar opções de ganho comum ao longo da negociação.
Na condução de uma negociação, é muito importante preparar diversas propostas distintas, sendo importante frisar que:
- todas sejam melhores do que a situação identificada como melhor alternativa ao acordo;
- cada uma delas alcance um ou mais dos interesses e;
- cada uma delas lhe permita atender, compreender ou debater o interesse das outras partes.
Essa preparação aumenta as chances de as partes encontrarem diferentes circunstâncias passíveis de debate e de aumento de eficiência do negócio.
ESTRATÉGIA DE NEGOCIAÇÃO INTEGRATIVA: EXPLORE INTERESSES E ADICIONE QUESTÕES
Ao iniciar negociações, sempre faça perguntas e escute com muita atenção. Descobrir interesses que você possa suprir e novas opções de frentes para a negociação pode ser um fator essencial para o sucesso de um trabalho. Perceba e transmita sua percepção de que é muito importante para você entender o lado da outra parte. Claro, você vai ter que estar pronto e preparado (com uma procuração para isso) para revelar um pouco sobre seus interesses. Em negociações complexas, informações são essenciais para que o advogado empresarial possa modelar diferentes soluções. A necessidade dessas informações gera perguntas, pois muitos assumem que revelar algo pode ser ruim, mas dificilmente é o caso.
Às vezes, tangenciar um assunto funciona, permitindo ter alguma noção dos interesses da outra parte. Por exemplo, para saber se a preocupação do seu novo cliente é seu preço ou se seu escritório tem a competência para a execução daquele trabalho, você pode perguntar algo como: “Você gostaria que nós colocássemos nossa equipe mais sênior no seu caso? O custo vai sair um pouco mais alto, mas terá nossa melhor equipe no caso.” De acordo com a resposta do cliente, você já vai saber algo mais sobre o que ele está pensando.
Um caminho interessante é buscar novos interesses comuns. Digamos que uma empresa de transportes em Sorocaba (SP) esteja realizando uma nova parceria com uma cervejaria em Petrópolis (RJ) e que ambas investem em projetos de ecologia. Por vezes, adicionar uma parceria no desenvolvimento destes projetos de ecologia pode aumentar o interesse de ambas na efetivação do objeto primário da negociação. Isso pode mudar o jogo.
ESTRATÉGIA DE NEGOCIAÇÃO INTEGRATIVA: JOGUE O JOGO DO ‘E SE?’
A busca por criar valor quase sempre passa por jogar o jogo do ‘E Se?’. Em uma negociação não é diferente.
Digamos que você esteja fazendo a negociação de um contrato de parceria de marketing entre um vinhedo em São José dos Pinhais (PR) e uma Queijaria de Araxá (MG). Juntos, criariam um canal de vídeos sobre queijos e vinhos, promovendo a imagem de ambos. Digamos que o advogado representando o vinhedo, vendo que seu cliente tem muito a ganhar com o projeto, pergunta: “E se o vinhedo entrar com 60% dos custos do projeto no primeiro ano, mas só com 40% dos custos no segundo ano?” Às vezes, basta um empurrãozinho para fechar um negócio. Pode não ser muito mais do que trocar seis por meia dúzia, mas pode ser o suficiente.
ESTRATÉGIA DE NEGOCIAÇÃO INTEGRATIVA: TRAGA MAIS PARTES PARA A NEGOCIAÇÃO
Ansiedade e outras questões podem impedir que as partes de uma negociação consigam dialogar abertamente, revelando seus interesses, em benefício da operação. Como já falei, informações são essenciais para uma negociação eficaz.
Para amenizar isso, pode ser essencial um mediador profissional ou alguém que já tenha trabalhado com as partes.
Digamos que uma fábrica de móveis em Ubá (MG) esteja fazendo uma parceria com uma fábrica em Jaraguá do Sul (SC). Com este acordo, ambas investirão em novos maquinários e área de galpão para que possam atender aos clientes uma da outra em um modelo colaborativo. Com isso, reduzirão o tempo de atendimento dos clientes e aumentarão suas margens de lucro. Digamos que o advogado empresarial de uma das empresas trouxe uma gestora de ativos para capitalizar a operação. Às vezes, uma empresa do mercado de capitais pode acabar funcionando como uma parte moderadora.
O mesmo funcionaria na compra de uma empresa por outra. Digamos que esta vá estruturar um modelo de financiamento da operação via mercado de capitais. As exigências do player financeiro intermediário podem trazer segurança para o adquirente e ajudar a todos a colocar os números e as condições no papel.
Trazer mais uma parte para a negociação adiciona complexidade, mas também pode aumentar o tamanho da operação e os benefícios. Claro, tudo será compartilhado entre as partes, mas isso pode acarretar em ganho de força e eficiência para o fechamento da operação.
A ADVOCACIA EMPRESARIAL E ESTRATÉGIAS DE NEGOCIAÇÃO INTEGRATIVA
A prática da advocacia empresarial passa por ser eficiente no desenvolvimento de negociações e para isso é essencial entender de estratégias de negociação integrativa.
O bom advogado empresarial começa mapeando os interesses e os riscos da negociação em curso. Em seguida, conscientemente modela quais estratégias podem ser adequadas para iniciar diálogos e propor modelos diferentes.
Escutando com cuidado as outras partes, poderá identificar pontos de pressão e alternativas. Novos passos podem se mostrar mais adequados, depois das primeiras reuniões.
O importante é entender que a oportunidade de duas partes negociarem pode ser muito mais vantajosa do que o motivo que as levou a isso. Estar disposto a se envolver e se comprometer com um processo de diálogo, em busca de um benefício mútuo, é um ato de liberdade. Para funcionar, todas as partes precisam dar um voto de confiança.
Depois disso, tudo começa a fluir e cada interesse vai naturalmente encontrando seu caminho, dentro do diálogo.
Manter o otimismo e preparar estratégias concretas de negociação são fatores essenciais para aumentar as chances de sucesso do trabalho. Por isso, é muito importante fazer o dever de casa e não se contentar com a primeira solução que parece funcionar.
1 Disponível em [ https://www.pon.harvard.edu/uncategorized/find-more-value-at-the-bargaining-table/ ].
2 Um exemplo: digamos que um advogado empresarial está negociando um acordo para estimular a distribuição de um serviço de educação online prestado no Rio de Janeiro (RJ). Este acordo é uma oportunidade que ele criou, ao sugerir esta ação em consultoria com seu cliente e realizar os primeiros contatos formais com a empresa. Caso a empresa feche esta parceria (via joint venture ou modelando de outra forma), a estimativa é um aumento de 20% em clientes em 6 meses. Caso não feche, portanto, a alternativa é o não aproveitamento da oportunidade, ou seja, os 20% a mais de clientes.
3 Por exemplo, imagine uma pequena fabricante de cerveja artesanal em Petrópolis (RJ). É um setor bem concorrido e no início não é fácil encontrar canais de distribuição. Nosso valente empresário cervejeiro começa a dialogar com outros cinco pequenos produtores, de forma que possam compartilhar uma planta industrial maior, assim como esforços de marketing. Dividindo os custos deste passo importante, poderão crescer mais rápido e alcançar um preço de venda mais competitivo. Ele poderia enumerar os interesses como: (1) reduzir custo de produção, (2) ampliar impacto de esforços de marketing, (3) ter uma operação mais enxuta e (4) fazer parte da formação de um modelo de negócio mais interessante, colaborativo e eficiente.
TIRE SUAS DÚVIDAS CONOSCO E DÊ SUGESTÕES SOBRE QUESTÕES JURÍDICAS EMPRESARIAS!