
A aquisição da propriedade imobiliária ocorre pelo(a):
– registro, no caso de negócio jurídico;
– acessão, na hipóteses de construções, formação de ilhas, plantações, avulsão, aluvião e abandono de álveo;
– usucapião;
– posse-trabalho;
– sucessão e;
– casamento.
A Compra e Venda está inclusa na hipótese de negócio jurídico, enquanto forma solene de aquisição de imóvel, sendo certo, portanto, que a escritura pública é essencial a sua validade, salvo no caso de leis especiais (negócios relativos ao Sistema Financeiro Imobiliários e Sistema Financeiro da Habitação.
O Código Civil estabelece:
“Código Civil Art. 481 – “Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.”
O artigo 481, seguindo o Princípio da Operabilidade – de modo a facilitar e viabilizar a consecução dos institutos privados – nos possibilita conceituar a compra e venda como o contrato pelo qual uma ou mais partes vendedoras se obrigam a transferir o domínio, de bem móvel ou imóvel, à parte ou partes compradoras, mediante remuneração denominada preço. Tratra-se, portanto, de contrato translativo.
Todos sabemos (ou ao menos já ouvimos algo a respeito) que a propriedade móvel – digamos, uma cadeira – é transferida pela tradição ou entrega do bem, enquanto o bem imóvel tem sua transferência formalizada pelo registro do contrato no Cartório de Registro Imobiliário (CRI).
O artigo 108 do Código Civil informa que “Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.”
Assim, temos que, em contratos de compra e venda de imóvel de valor inferior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país, não há necessidade de contrato público, lavrado por tabelião.
Hoje em dia, a outorga marital – que é a anuência ou concordância do marido ou da mulher na escritura pública –, não é necessária, nos termos do art. 1647[1] do Código Civil, quando a união for regime de separação total de bens ou participação final nos aquestos, desde que, neste último caso haja pacto antenupcial (art. 1656[2] do Código Civil). No regime do Código Civil anterior, de 1916, em seu art. 235[3] (em vigor até 11 de Janeiro de 2003), independente do regime de bens, a outorga era sempre necessária. Por isso, a norma de transição é que, para os casamentos celebrados, a partir de 12 de Janeiro de 2003, pelo regime de separação de bens, a anuência não é necessária, nos termos do art. 2039 do Novo Código Civil[4]. Assim, muito embora haja quem pense diferentemente acerca desta necessidade, qualquer que seja o regime do casamento celebrado anteriormente a 12 de Janeiro de 2003, a outorga é necessária.
Estes detalhes são importantes, uma vez que a outorga uxória – ou concordância do marido ou da mulher na escritura pública –, quando exigível, torna a venda anulável. Esta anulação pode ser requerida pelo cônjuge que não concedeu a anuência no prazo decadencial de dois anos (pelo art. 1649[5] do Código Civil).
A venda de ascendente a descendente é outro ponto a se falar, pois demanda a concordância dos demais descendentes e também do cônjuge, salvo no caso de regime de separação total, nos termos do art. 496 do Código Civil[6].
Bom, a realização da escritura pública, quando essencial ao negócio, é um passo importante, mas as aquisição de um bem imóvel não se encerra por aí. O registro deste título de aquisição, seja qual for, deve ser efetuado junto ao Oficial de Registro de Imóveis da circunscrição imobiliária competente. Isso é o que deccore dos artigos 108[7], 1227[8], 1245[9] e 1267[10], todos do Código Civil. Do registro do negócio jurídico, no caso, decorre o direito real sobre o imóvel, nos termos do art. 1245 do Código Civil.
Vamos dizer que João, residente na cidade de Friburgo (RJ), compra um imóvel no Rio de Janeiro de Pedro. Se João não registra esta escritura e Pedro, muito esperto, vende o mesmo imóvel para Carla, que leva a documentação logo para registro – como diz o artigo 1227 do Código Civil –, João não vai ter adquirido a propriedade: dormiu no ponto e não adquiriu o direito real, mas apenas direito pessoal e obrigacional. Com este direito, pode acionar judicialmente o Pedro, buscando responsabilizá-lo patrimonialmente, pois foi ele que vendeu o bem e depois o vendeu de novo. No entanto, não será viável acionar a Carla em busca do imóvel, pois ela o adquiriu legalmente e João não possui direito real, oponível erga omnes (ou seja, poderá opor o direito contra quem quer que seja, em relação a todos).
Assim: “O modus é condicionado pelo titulus.” (STJ, REsp 5.801/SP, Rel. Min. Waldemar Zveiter, 3ª Turma, j. 10.12.1990, DJ 04.02.1991, p. 576).
Por isso, não dá para frisar o suficiente: a aquisição de um bem imóvel por negócio jurídico só se realiza com o registro do título aquisitivo junto ao oficial de Registro de Imóveis da circunscrição imobiliária com competência para aquela área.
Cada imóvel possui uma única matrícula junto ao registro público de imóveis, com uma numeração e uma descrição da propriedade, com atribuição de titular. Nesta matrícula serão registrados e averbados todos os fatos jurídicos que de algum modo alterem direito nele inscrito ou a ele relacionado.
Os registros são tratados pelo art. 167, I da Lei 6.015/73 e possuem a função de anotar na matrícula do bem os atos translativos ou declaratórios de operações imobiliárias, relativas a direitos reais, como hipotecas, promessas de compra e venda, incorporações, loteamentos, entre outros.
As averbações são tratadas pelo art. 167, II, da Lei 6.015/73 e falam sobre outro gênero de mudanças de registro, como cláusulas de inalienabilidade, alterações de nome, decorrente, por exemplo, de casamento ou outros.
Os registros e averbações seguem o seguinte processo:
Como muitas áreas do direito, o Direito Registral tem alguns princípios que o norteiam, sendo alguns dos mais importantes:
De modo a viabilizar a realização das etapas e a eficiência das consultas públicas (que poderiam ser efetuadas online e um dia serão e vamos torcer para isso), o Registro de Imóveis funciona com cinco livros:
Independente desta organização do registro, ele não possui presunção absoluta, mas apenas relativa. O que isso quer dizer? Vejamos o teor do art. 1247 do Código Civil
“Art. 1.247. Se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar que se retifique ou anule.
Parágrafo único. Cancelado o registro, poderá o proprietário reivindicar o imóvel, independentemente da boa-fé ou do título do terceiro adquirente.”
Esta norma nos informa que o Registro admite a exigência de retificação de seu conteúdo, caso hajam provas de que ele possui algum vício.
Vamos supor que você comprou aquele imóvel tão almejado, o sonho da casa própria naquele bairro aconchegante de Friburgo, no Rio de Janeiro, registrou e, alguns anos depois, tentando vender o imóvel, pois já havia se mudado para Petrópolis, solicitou certidão atualizada e descobriu que uma mulher que você não conhece registrou o imóvel no nome dela. Indo a fundo, descobriu que alguém assinou uma procuração para a parte vendedora, mas não foi você! Ora, trata-se de uma fraude. Neste caso, você, parte prejudicada, pode promover ação anulatória, independentemente do comprador de boa-fé (digamos que ele não soubesse da fraude). Poderá ser feita também ação reinvidicatória do bem, cumulada – ou seja, junto – à de anulação do registro, de forma a tomar posse do bem. O adquirente de boa-fé, por sua vez, poderá, cumpridos os requisitos, promover exceção de usucapião, estabelecendo que, mesmo que a aquisição por compra não tenha sido realizada de forma válida, ocorreu aquisição pelo instituto da usucapião.
Essa situação nos leva ao velho adágio jurídico: o direito não socorre aos que dormem (dormientibus non succurrit jus). Por isso, temos que agir com diligência e segurança ao realizar este tipo de operação, que sempre carrega consigo algum risco.
[1] Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:
I – alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;
II – pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;
III – prestar fiança ou aval;
IV – fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.
Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada.
[2] Art. 1.656. No pacto antenupcial, que adotar o regime de participação final nos aqüestos, poder-se-á convencionar a livre disposição dos bens imóveis, desde que particulares.
[3] Código Civil de 1916: Art. 235. O marido não pode, sem consentimento da mulher, qualquer que seja o regime de bens:
III. Prestar fiança (arts. 178, § 9º, nº I, b, e 263, nº X).
[4] Art. 2.039. O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916, é o por ele estabelecido.
[5] Art. 1.649. A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art. 1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade conjugal.
[6] Art. 496. É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido.
Parágrafo único. Em ambos os casos, dispensa-se o consentimento do cônjuge se o regime de bens for o da separação obrigatória.
[7] Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
[8] Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código.
[9] Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.
[10] Art. 1.267. A propriedade das coisas não se transfere pelos negócios jurídicos antes da tradição.
Parágrafo único. Subentende-se a tradição quando o transmitente continua a possuir pelo constituto possessório; quando cede ao adquirente o direito à restituição da coisa, que se encontra em poder de terceiro; ou quando o adquirente já está na posse da coisa, por ocasião do negócio jurídico.
[11] Lei 6.015/73, art. 174 – “O livro nº 1 – Protocolo – servirá para apontamento de todos os títulos apresentados diariamente, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 12 desta Lei.”
Como podemos ajudar?